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quinta-feira, 25 de julho de 2013

Blancanieves

     Com alguns meses de atraso chega ao Brasil o premiadíssimo Branca de Neve de Pablo Berger. Ambientado na Sevilha dos anos 20 é um filme em preto em branco, sem diálogos e apresentado na ancestral janela quadrada. Começou a ser planejado há quase uma década, até que finalmente o diretor conseguisse produtores interessados em financiá-lo. 
       Antonio Villalta (Daniel Giménez Cacho) é um toureiro, o mais famoso e adorado da Espanha. Porém cegado por sua vaidade, não percebe que está correndo risco, e quando é ferido fica à beira da morte. Enquanto isso, sua esposa (Inma Cuesta) dá à luz a uma menina e morre. A garota, Carmencita (Sofía Oria), cresce aos cuidados da avó (Ángela Molina). Já o toureiro, que ficou paraplégico, casa-se com a enfermeira interesseira que tratou dele no hospital, Encarna (Maribel Verdú).  Encarna segue uma trajetória de mera enfermeira a rainha malvada, dominando o casarão dos Villalta – trancando o marido no andar superior e tomando o motorista (Pere Ponce) como seu amante. Com a morte da avó, a menina é mandada para a casa do pai, com quem nunca teve contato. A madrasta a proíbe de subir para o segundo andar. Porém, a menina tanto faz que reencontra o toureiro, solitário numa cadeira de rodas preso a um quarto. Se, num primeiro momento, há estranhamento entre eles, com o tempo se tornam amigos, e ele lhe ensina técnicas de tourada. Percebendo a situação, Encarna obriga o motorista a matar a menina, mas ele não consegue. Por uma fatalidade, ela fica com amnésia e acaba adotada por seis (e não sete) anões toureiros, que a chamam de Branca de Neve. Essa segunda parte ganha ares circense chegando a um final lindamente melancólico.



Algumas criticas do filme: 

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Mutilação e suicídio

Criada pelo dinamarquês Hans Christian Andersen, em 1837, A Pequena Sereia é um relato pra lá de brutal.
1. NAVALHA NA CARNE
No original, a Bruxa do Mar corta a língua de Ariel, que perde a voz. Além disso, a sereia tem a cauda rasgada em duas para virar mulher e conquistar o coração do príncipe. Mas, a cada passo, as pernas sangram e doem.
2. CABEÇA FEITA
Na insistência para que Ariel voltasse a ser sereia, suas irmãs chegam a arrancar os cabelos - literalmente! O objetivo era oferecer as madeixas para que a bruxa do mar rompesse o encanto.
3. FIM DA LINHA
Em troca dos cabelos, a bruxa dá uma faca para Ariel matar o príncipe - que a trocara por outra - e voltar a ser sereia. Traída e desenganada, Ariel se mata pulando de um abismo no mar gelado.

Mãe má!

Inveja, tortura e sugestão de canibalismo roubam a cena dos anões nas versões mais hardcore de Branca de Neve.
1. ESPELHO MAU
Na primeira versão dos Grimm, de 1810, é a mãe, e não a madrasta, que pira no espelho como sendo a mais bela do reino. Invejosa por perder o posto, planeja dar um sumiço na filhinha de apenas 7 anos.
2. DANÇANDO EM BRASAS
Após ter o plano frustrado, a rainha é condenada, no meio da festa de casamento de Branca com o príncipe. Como pena, a ex-poderosa tem que dançar até a morte calçando sapatos de ferro em brasa!
MUNDO CANIBAL
A rainha manda um caçador matar Branca de Neve na floresta, trazendo o fígado e um pulmão como prova do serviço. Ele engana a rainha com carne de javali, que a mãe come achando ser da filha.

Gata Barraqueira

Ao contrário da donzela boazinha que conhecemos, nas versões mais antigas, a Cinderela é quem começa a pancadaria!
1. GOLPE DO BAÚ
Na versão de Giambattista Basile, chamada A Gata Borralheira, a heroína une forças com a governanta para matar a madrasta. Um dia, quando a megera pega roupas num baú, a moça lhe fecha a tampa na cabeça.
2. NA PONTA DOS PÉS
Os irmãos Grimm botam mais sangue no miolo da história. Quando o príncipe visita as casas para identificar o pé de sua amada, as irmãs malvadas de Cinderela se mutilam para tentar calçar o sapatinho, cortando dedos e calcanhares.
3. ORA, POMBOS
Na versão dos Grimm, a madrasta também não é morta por Cinderela. A malvada bate as botas com pombos comendo seus olhos e os das filhas.

Estupro e adultério

Sexo com pessoa em coma e feitiçaria são o tempero de Bela Adormecida, história que tem até uma versão feita no Brasil.
À moda italiana
Giambattista Basile apimentou a história no século 17.
1. FARPA MALDITA
Ao mexer num tear, uma farpa entra sob a unha de Tália, provocando sono imediato - maldição prevista desde sua infância. Desconsolado, o pai abandona a casa, largando a filha adormecida sozinha.
2. NOIVA CADÁVER
Numa caçada, o rei, que já era casado, se encanta por Tália e, antes de partir, transa com a moça apagada! Ela ainda engravida de gêmeos. Um dia, ao tentar mamar, um deles chupa o dedo da mãe e retira a farpa, despertando-a.
3. AMADA AMANTE
Um ano após o encontro, o rei volta à floresta, encontra Tália acordada e passa a esticar as caçadas para manter a vida dupla. A esposa desconfia e põe um espião na cola do rei.
Bela do Brasil
A versão brasuca também sangra. O escritor brasileiro Sílvio Romero publicou, em 1885, em Contos Populares do Brasil, a história de um rei que, numa caçada pela floresta, se apaixona pela camponesa Madalena Sinhá. Em seguida, o rei constitui uma segunda família no campo, mas é delatado por um servo da rainha. No final, a amante e a rainha saem na mão até que Madalena mata a rival, com ajuda do rei. E o servo dedo-duro acaba degolado.
À moda francesa
Nas mãos de Charles Perrault, o final é violento.
1. GUARDA NA DESPENSA
O cozinheiro esconde as crianças e abre o jogo com Bela - que a rainha também estava a fim de jantar. Ao ouvir o choro das crianças, a rainha descobre o engodo e resolve cozinhar todo mundo.
2. BANQUETE DE GENTE
Furiosa com o filho por assumir Bela como rainha, a ogra ordena ao cozinheiro que faça para ela um rango com a carne do neto e da neta. O criado, porém, serve carne de carneiro e de cabrito para enganá-la.
3. CALDEIRÃO ANIMAL
O caldeirão que vai ferver geral é recheado com sapos, víboras, enguias e cobras. No último instante, porém, o rei aparece e a ogra, amedrontada, se joga de cabeça, sendo devorada pelas feras.
4. QUE OGRA DE SOGRA
Agora a vilã é a mãe do rei. A sogra de Bela - que não tem nome nesta versão - é uma ogra, faminta por crianças! Não à toa, o rei não conta nada à megera sobre seus netinhos.

Vermelho cor de sangue

A tonalidade mais chamativa na roupa da doce Chapeuzinho combina com uma história cheia de violência, canibalismo e insinuações sensuais.
ERA UMA VEZ...
A maioria dos contos de fadas, como Chapeuzinho Vermelho, surgiu por volta da Idade Média, em rodas de camponeses na Europa, onde eram narrados para toda a família. "A fome e a mortalidade infantil serviam de inspiração", diz a especialista em histórias infantis Marina Warner, da Universidade de Essex, na Inglaterra.
FINAL FELIZ
Ao fim da versão francesa, Chapeuzinho, sentindo-se ameaçada, pede para sair e fazer suas necessidades fora da casa. O lobo, nojentão, insiste para que ela faça xixi na cama mesmo - urg! -, mas acaba deixando a menina sair. Esperta, Chapeuzinho aproveita o vacilo do vilão e escapa.
FINAL SANGRENTO
O francês Charles Perrault foi o primeiro a pôr muitos contos de fadas no papel, no século 17. Ele tornou o final da história mais sangrento - com o lobo jantando a mocinha - e introduziu a famosa moral da história, dizendo que "crianças não devem falar com estranhos para não virar comida de lobo".
FINAL AMENIZADO
No século 19, os irmãos alemães Jacob e Wilhelm Grimm - famosos compiladores de contos que até então só eram transmitidos oralmente -, inventaram a figura do caçador. No fim da história, ele aparece e salva a pele de Chapeuzinho e da vovó, abrindo a barriga do lobo com um tesourão.
1. COMIDA DE VÓ
Numa versão francesa da história, após interrogar Chapeuzinho na floresta e pegar um atalho para a casa da vovó, o lobo mata e esquarteja a velhinha sem dó. A coisa piora quando o vilão, já fingindo ser a vovó, oferece a carne e o sangue da vítima, como se fosse vinho, para matar a fome da netinha - que come e bebe com gosto!
2. TIRA, TIRA...
Após encher o bucho e praticar canibalismo sem saber, Chapeuzinho ainda tira a roupa e joga no fogo, a pedido do lobão! O clima, porém, não é nada infantil, com a garota perguntando o que fazer com a roupa a cada peça tirada. O lobo só tinha uma resposta: "Jogue no fogo, minha criança. Você não vai mais precisar disso...".
3. SEDUÇÃO INFANTIL
Ao se deitar ao lado do lobo, já totalmente nua, Chapeuzinho começa a reparar no físico do vilão, como se desconfiasse de algo. Admirada, a menina começa a exclamar: "como você é peluda, vovó", "que ombros largos você tem" e "que bocão você tem", entre outros elogios à anatomia do bichão...
*Fontes: Conte de la mère-grand (coletado pelo folclorista Achille Millien por volta de 1870); Pentameron, de Giambattista Basile; Tales of Mother Goose, de Charles Perrault; Childrens and Household Tales, dos irmãos Grimm; Da Fera à Loira, de Marina Warner; A Princesa que Dormia (coletânea publicada pela editora Paraula) .

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Perrault e Capinha Vermelha


O lobo consegue entrar na casa da avó fingindo ser Capinha Vermelha e engole imediatamente a velhinha. Na história de Perrault o lobo não se disfarça de avó. Simplesmente deita-se na cama dela. Quando Capinha chega, o lobo pede-lhe que se deite com ele. Capinha Vermelha tira a roupa e entra na cama, quando então se espanta com a aparência desnuda da avó, e exclama: "Vovó, que braços enormes você tem!", ao que o lobo responde: - "São para te abraçar melhor!" - Capinha então diz: - Vovó, que pernas grandes você tem!" - e recebe como resposta: - "São para correr melhor!" - Seguem-se a este dois diálogos, (que não ocorrem na versão dos Irmãos Grimm), perguntas bem conhecidas sobre os olhos, orelhas e dentes grandes da Avó".

Quando Perrault publicou sua coleção de contos de fadas em 1697, Capinha Vermelha já era uma história antiga, com elementos que remontavam a tempos atrás. Existe o mito de Cronos onde ele engole os filhos que de modo miraculosoconseguem sair de seu estômago, e no lugar deles colocam pedras pesadas. Há uma história Latina, de 1023 (de Egberto de Lièges, chamada Fecunda ratis), na qual uma menininha é descoberta na companhia dos lobos; a menina usa uma manta vermelha, de grande importância para ela, e os estudiosos dizem que esta manta era um capuz vermelho. Aqui, então, seis séculos ou mais antes da estória de Perrault, encontramos alguns elementos básicos de Capinha Vermelha: uma menina com um capuz vermelho, a companhia dos lobos, uma criança sendo devorada viva que retorna incólume, e uma pedra colocada no lugar da criança.

Há outras versões de Capinha Vermelha, mas não sabemos qual delas influenciou Perrault na sua narrativa. Em algumas o lobo faz Capinha Vermelha comer a carne da avó e beber seu sangue, apesar de vozes advertirem-na do contrário.
(p. 204)

BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fadas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Cinderela segundo os Irmãos Grimm


Para aproveitar o fim de semana estamos inaugurando nossa nova coluna : Versões, cada um faz do seu jeito. Para está estreia escolhemos Cinderella o conto de fadas mais conhecido. Sabe-se sua versão mais antiga é de uma história contada na China, onde os pés pequenos eram considerados um sinal de beleza. A versão do francês Charles Perrault, de 1697, é que tem fada madrinha, carruagem-abóbora, e o sapatinho de cristal. Nas versões anteriores, transmitidas oralmente, Cinderela recebe a ajuda de sua mãe, cujo espírito se materializa sob forma de peixe, vaca ou árvore. Ao criar a fada madrinha Perrault acrescentou um toque mais poético a essa tradição. Na versão dos Irmãos Grimm, Cinderela não tem fada-madrinha. O texto é assim contado:
Há muito tempo, aconteceu que a esposa de um rico comerciante adoeceu gravemente e, sentindo seu fim se aproximar, chamou sua única filha e disse:
- Querida filha, continue piedosa e boa menina que Deus a protegerá sempre. Lá do céu olharei por você, e estarei sempre a seu lado - mal acabou de dizer isso,fechou os olhos e morreu. A jovem ia todos os dias visitar o túmulo da mãe,sempre chorando muito. Veio o inverno, e a neve cobriu o túmulo com seu alvo manto. Chegou a primavera, e o sol derreteu a neve. Foi então que o viúvo resolveu se casar outra vez. A nova esposa trouxe suas duas filhas, ambas louras e bonitas - mas só exteriormente. As duas tinham a alma feia e cruel. A partir desse momento, dias difíceis começaram para a pobre enteada.
- Essa imbecil não vai ficar no quarto conosco! - Reclamaram as moças. - O lugar dela é na cozinha! Se quiser comer pão, que trabalhe! Tiraram-lhe o vestido bonito que ela usava, obrigaram-na a vestir outro, velho e desbotado, e a calçar tamancos.
- Vejam só como está toda enfeitada, a orgulhosa princesinha de antes!
- Disseram a rir, levando-a para a cozinha. A partir de então, ela foi obrigada a trabalhar, da manhã à noite, nos serviços mais pesados. Era obrigada a se levantar de madrugada, para ir buscar água e acender o fogo. Só ela cozinhava e lavava para todos. Como se tudo isso não bastasse, as irmãs caçoavam dela e a humilhavam. Espalhavam lentilhas e feijões nas cinzas do fogão e obrigavam-na a catar um a um. À noite, exausta de tanto trabalhar, a jovem não tinha onde dormir e era obrigada a se deitar nas cinzas do fogão. E, como andasse sempre suja e cheia de cinza, só a chamavam de Cinderela. Uma vez, o pai resolveu ir a uma feira. Antes de sair, perguntou às enteadas o que desejavam que ele trouxesse.
- Vestidos bonitos - disse uma.
- Pérolas e pedras preciosas - disse a outra.
- E você, Cinderela, o que vai querer? - perguntou o pai.
- No caminho de volta, pai, quebre o primeiro ramo que bater no seu chapéu e traga-o para mim. Ele partiu para a feira, comprou vestidos bonitos para uma das enteadas, pérolas e pedras preciosas para a outra e, de volta para casa, quando cavalgava por um bosque, um ramo de aveleira bateu no seu chapéu. Ele quebrou o ramo e levou-o. Chegando em casa, deu às enteadas o que haviam pedido e à Cinderela, o ramo de aveleira. Ela agradeceu, levou o ramo para o túmulo da mãe, plantou-o ali, e chorou tanto que suas lágrimas regaram o ramo. Ele cresceu e se tornou uma aveleira linda. Três vezes, todos os dias, a menina ia chorar e rezar embaixo dela. Sempre que a via chegar, um passarinho branco voava para a árvore e, se a ouvia pedir baixinho alguma coisa, jogava-lhe o que ela havia pedido. Um dia, o rei mandou anunciar uma festa, que duraria três dias. Todas as jovens bonitas do reino seriam convidadas, pois o filho dele queria escolher entre elas aquela que seria sua futura esposa. Quando souberam que também deveriam comparecer, as duas filhas da madrasta ficaram contentíssimas.
- Cinderela! - Gritaram. - Venha pentear nosso cabelo, escovar nossos sapatos e nos ajudar a vestir, pois vamos a uma festa no castelo do rei!
Cinderela obedeceu chorando, porque ela também queria ir ao baile. Perguntou à madrasta se poderia ir, e esta respondeu:
- Você, Cinderela! Suja e cheia de pó, está querendo ir à festa? Como vai dançar, se não tem roupa nem sapatos? Mas Cinderela insistiu tanto, que afinal ela disse:
- Está bem. Eu despejei nas cinzas do fogão um tacho cheio de lentilhas. Se você conseguir catá-las todas em duas horas, poderá ir. A jovem saiu pela porta dos fundos, correu para o quintal e chamou:
- Mansas pombinhas e rolinhas! Passarinhos do céu inteiro! Venham me ajudar a catar lentilhas! As boas vão para o tacho! As ruins para o seu papo! Logo entraram pela janela da cozinha duas pombas brancas; a seguir, vieram as rolinhas e, por último, todos os passarinhos do céu chegaram numa revoada e pousaram nas cinzas. As pombas abaixavam a cabecinha e pic, pic, pic, apanhavam os grãos bons e deixavam cair no tacho. As outras avezinhas faziam o mesmo. Não levou nem uma hora, o tacho ficou cheio e as aves todas voaram para fora. Cheia de alegria, a menina pegou o tacho e levou para a madrasta, certa de que agora poderia ir à festa. Porém a madrasta disse:
- Não, Cinderela. Você não tem roupa e não sabe dançar. Só serviria de caçoada para os outros.
Como a menina começou a chorar, ela propôs:
- Se você conseguir catar dois tachos de lentilhas nas cinzas em uma hora, poderá ir conosco. Enquanto isso, pensou consigo mesma: "Isso ela não vai conseguir..." Assim que a madrasta acabou de espalhar os grãos nas cinzas, Cinderela correu para o quintal e chamou:
- Mansas pombinhas e rolinhas! Passarinhos do céu inteiro! Venham me ajudar a catar lentilhas! As boas vão para o tacho! As ruins para o seu papo! E entraram pela janela da cozinha duas pombas brancas; a seguir vieram as rolinhas e, por último, todos os passarinhos do céu chegaram numa revoada e pousaram nas cinzas. As pombas abaixavam a cabecinha e pic, pic, pic, apanhavam os grãos bons e
deixavam cair no tacho. Os outros pássaros faziam o mesmo. Não passou nem meia hora, e os dois tachos ficaram cheios. As aves se foram voando pela janela. Então, a menina levou os dois tachos para a madrasta, certa de que, desta vez, poderia ir à festa. Porém, a madrasta disse:
- Não adianta, Cinderela! Você não vai ao baile! Não tem vestido, não sabe dançar e só nos faria passar vergonha! E, dando-lhe as costas, partiu com suas orgulhosas filhas. Quando ficou sozinha, Cinderela foi ao túmulo da mãe e embaixo da aveleira, disse:
- Balance e se agite, árvore adorada, cubra-me toda de ouro e prata! Então o pássaro branco jogou para ela um vestido de ouro e prata e sapatos de seda bordada de prata. Cinderela se vestiu, a toda pressa, e foi para a festa. Estava tão linda, no seu vestido dourado, que nem as irmãs, nem a madrasta a reconheceram. Pensaram que fosse uma princesa estrangeira - para elas, Cinderela só poderia estar em casa, catando lentilhas nas cinzas. Logo que a viu, o príncipe veio a seu encontro e, pegando-lhe a mão, levou-a para dançar. Só dançou com ela, sem largar de sua mão por um instante. Quando alguém a convidava para dançar, ele dizia:
- Ela é minha dama. Dançaram até altas horas da noite e, afinal, Cinderela quis voltar para casa.
- Eu a acompanho - disse o príncipe. Na verdade, ele queria saber a que família ela pertencia. Mas Cinderela conseguiu escapar dele, correu para casa e se escondeu no pombal. O príncipe esperou o pai dela chegar e contou-lhe que a jovem desconhecida tinha saltado para dentro do pombal. "Deve ser Cinderela...", pensou o pai. E mandou vir um machado para arrombar a porta do pombal. Mas não havia ninguém lá dentro. Quando chegaram em casa, encontraram Cinderela com suas roupas sujas, dormindo nas cinzas, à luz mortiça de uma lamparina. A verdade é que, assim que entrou no pombal, a menina saiu pelo lado de trás e correu para a aveleira. Ali, rapidamente tirou seu belo vestido e deixou-o sobre o túmulo. Veio o passarinho, apanhou o vestido e levou-o. Ela vestiu novamente seu vestidinho velho e sujo, correu para casa e se deitou nas cinzas da cozinha. No dia seguinte, o segundo dia da festa, quando os pais e as irmãs partiram para o castelo, Cinderela foi até a aveleira e disse:
- Balance e se agite, árvore adorada, cubra-me toda de ouro e prata! E o pássaro atirou para ela um vestido ainda mais bonito que o da véspera. Quando ela entrou no salão assim vestida, todos ficaram pasmados com sua beleza. O príncipe, que a esperava, tomou-lhe a mão e só dançou com ela. Quando alguém convidava a jovem para dançar, ele dizia:
- Ela é minha dama. Já era noite avançada quando Cinderela quis ir embora. O príncipe seguiu-a, para ver em que casa entraria. A jovem seguiu seu caminho e, inesperadamente, entrou no quintal atrás da casa. Ágil como um esquilo, subiu pela galharia de uma frondosa pereira carregada de frutos que havia ali. O príncipe não conseguiu descobri-la e, quando viu o pai dela chegar, disse:
- A moça desconhecida escondeu-se nessa pereira. "Deve ser Cinderela", pensou o pai. Mandou buscar um machado e derrubou a pereira. Mas não encontraram ninguém na galharia. Como na véspera, Cinderela já estava na cozinha dormindo nas cinzas, pois havia escorregado pelo outro lado da pereira, correra para a aveleira, e devolvera o lindo vestido ao pássaro. Depois, vestiu o feio vestidinho de sempre, e correu para casa. No terceiro dia, assim que os pais e as irmãs saíram para a festa, Cinderela foi até o túmulo da mãe e pediu à aveleira:
- Balance e se agite, árvore adorada, cubra-me toda de ouro e prata! E o pássaro atirou-lhe o vestido mais suntuoso e brilhante jamais visto, acompanhado de um par de sapatinhos de puro ouro. Ela estava tão linda, tão linda, que, quando chegou ao castelo, todos emudeceram de assombro. O príncipe só dançou com ela e, como das outras vezes, dizia a todos que vinham tirá-la para dançar:
- Ela é minha dama. Já era noite alta, quando Cinderela quis voltar para casa. O príncipe tentou segui-la, mas ela escapuliu tão depressa, que ele não pode alcançá-la. Dessa vez, porém, o príncipe usara um estratagema: untou com piche um degrau da escada e, quando a moça passou, o sapato do pé esquerdo ficou grudado. Ela deixou-o ali e continuou correndo. O príncipe pegou o sapatinho: era pequenino, gracioso e todo de ouro. No outro dia, de manhã, ele procurou o pai e disse:
- Só me casarei com a dona do pé que couber neste sapato. As irmãs de Cinderela ficaram felizes e esperançosas quando souberam disso, pois tinham pés delicados e bonitos. Quando o príncipe chegou à casa delas, a mais velha foi para o quarto acompanhada da mãe e experimentou o sapato. Mas, por mais que se esforçasse, não conseguia meter dentro dele o dedo grande do pé. Então, a mãe deu-lhe uma faca, dizendo:
- Corte fora o dedo. Quando você for rainha, vai andar muito pouco a pé. Assim fez a moça. O pé entrou no sapato e, disfarçando a dor, ela foi ao encontro do príncipe. Ele recebeu-a como sua noiva e levou-a na garupa do seu cavalo. Quando passavam pelo túmulo da mãe de Cinderela, que ficava bem no caminho, duas pombas pousaram na aveleira e cantaram:
- Olhe para trás! Olhe para trás! Há sangue no sapato, que é pequeno demais! Não é a noiva certa que vai sentada atrás! O príncipe virou-se, olhou o pé da moça e logo viu o sangue escorrendo do sapato. Fez o cavalo voltar e levou-a para a casa dela. Chegando lá, ordenou à outra filha da madrasta que calçasse o sapato. Ela foi para o quarto e calçou-o. Os dedos do pé entraram facilmente, mas o calcanhar era grande demais e ficou de fora. Então, a mãe deu-lhe uma faca dizendo:
- Corte fora um pedaço do calcanhar. Quando você for rainha, vai andar muito pouco a pé. Assim fez a moça. O pé entrou no sapato e, disfarçando a dor, ela foi ao encontro do príncipe. Ele aceitou-a como sua noiva e levou-a na garupa do seu cavalo. Quando passavam pela aveleira, duas pombinhas pousaram num dos ramos e cantaram:
- Olhe para trás! Olhe para trás! Há sangue no sapato, que é pequeno demais! Não é a noiva certa que vai sentada atrás! O príncipe olhou o pé da moça, viu o sangue escorrendo e a meia branca, vermelha de sangue. Então virou seu cavalo, levou a falsa noiva de volta para casa e disse ao pai:
- Esta também não é a verdadeira noiva. Vocês não têm outra filha?
- Não - respondeu o pai - a não ser a pequena Cinderela, filha de minha falecida esposa. Mas é impossível que seja ela a noiva que procura. O príncipe ordenou que fossem buscá-la.
- Oh, não! Ela está sempre muito suja! Seria uma afronta trazê-la a vossa presença! - protestou a madrasta. Porém o príncipe insistiu, exigindo que ela fosse chamada. Depois de lavar o rosto e as mãos ela veio, curvou-se diante do príncipe e pegou o sapato de ouro que ele lhe estendeu. Sentou-se num banquinho, tirou do pé o pesado tamanco e calçou o sapato, que lhe serviu como uma luva. Quando ela se levantou, o príncipe viu seu rosto e reconheceu logo a linda jovem com quem havia dançado.
- É esta a noiva verdadeira! - exclamou, feliz. A madrasta e as filhas levaram um susto e ficaram brancas de raiva. O príncipe ergueu Cinderela, colocou-a na garupa do seu cavalo e partiram. Quando passaram pela aveleira, as duas pombinhas brancas cantaram:
- Olhe pare trás! Olhe pare trás! Não há sangue no sapato, que serviu bem demais! Essa é a noiva certa. Pode ir em paz! E, quando acabaram de cantar, elasvoaram e foram pousar, uma no ombro direito de Cinderela, outra no esquerdo; ali ficaram. Quando o casamento de Cinderela com o príncipe se realizou, as falsas irmãs foram à festa. A mais velha ficou à direita do altar, e a mais nova, à esquerda. Subitamente, sem que ninguém pudesse impedir, a pomba pousada no ombro direito da noiva voou para cima da irmã mais velha e furou-lhe os olhos. A pomba do ombro esquerdo fez o mesmo com a mais nova, e ambas ficaram cegas para o resto de suas vidas.

domingo, 27 de setembro de 2009

Foto de Dogville
Na versão dos irmãos Grimm, Branca de Neve tem apenas sete anos. Príncipes pedófilos era normais... O prícipe carrega seu corpo morto com ele para o palácio. Algum tipo de necrofilia? Depois de algum tempo, um de seus servos, cançado de ter que carregar o caixão de um lado para o outro, resolve descontar suas frustrações dando uma baita de uma surra na Branca de Neve. Um dos golpes no estômago faz com que ela vomite a maçã e volte a vida.




quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Neve, Vidro, Maçãs

Por Neil Gaiman
Eu não sei que espécie de coisa ela é. Nenhum de nós sabe. Ela matou sua mãe ao nascer, e nunca é demais lembrar sua culpa por isso.
Dizem que sou sábia, mas estou longe disso. Tudo que previ foram fragmentos, momentos congelados e presos em poças d'água ou no vidro do meu espelho. Se eu fosse sábia, não teria tentado mudar o que vi. Se eu fosse sábia, teria me matado antes mesmo de encontrá-la, antes mesmo de tê-lo conquistado. Sábia, e bruxa, ou assim o dizem, e eu tinha visto o rosto dele nos meus sonhos e pensamentos por toda a minha vida: dezesseis anos a sonhar com ele, antes do dia em que ele parou seu cavalo perto da ponte, naquela manhã, e perguntou meu nome. Ele me ajudou a montar no seu altivo cavalo, e fomos juntos para minha pequena propriedade no campo, meu rosto enterrado no dourado dos seus cabelos. Ele me pediu o que eu tinha de melhor; era seu direito, por ser rei.

Sua barba era de um vermelho-bronze à luz da manhã, e eu o conheci, não como um rei, pois eu não sabia nada sobre reis então, mas como meu amor. Ele teve de mim tudo o que queria - é um direito dos reis - mas me retribuiu no dia seguinte, e na noite também: sua barba tão vermelha, seu cabelo tão dourado, seus olhos do azul de um céu de verão, sua pele bronzeada, com a cor gentil do trigo maduro.

Sua filha era só uma criança: não mais que cinco anos de idade quando eu cheguei ao palácio. Um retrato da sua mãe morta pendia da parede do seu quarto, na torre: uma mulher alta, seu cabelo da cor do ébano, os olhos castanhos. Sua pálida filha não parecia descender dela.

A garota não fazia suas refeições conosco. Eu não sei em que lugar do palácio ela comia. Eu tinha meus próprios aposentos. Meu marido, o rei, também. Quando ele me queria, ele mandava me procurar, e eu ia até ele, e lhe dava prazer, e também recebia um pouco.

Uma noite, vários meses após eu ser levada ao palácio, ela veio aos meus aposentos. Estava com seis anos. Eu bordava à luz do lampião, apertando meus olhos à sua fumaça e à sua parca iluminação. Quando levantei os olhos, ela estava ali.

- Princesa?

Ela não disse nada. Seus olhos eram negros como o carvão, negros como seus cabelos; seus lábios eram mais vermelhos que o sangue. Ela olhou para mim e sorriu. Seus dentes pareceram afiados, mesmo ali, à luz do lampião.

- O que você está fazendo fora do seu quarto?

- Estou com fome - ela disse, como qualquer criança. Era inverno, um tempo em que comida fresca é como um sonho de calor e luz do sol; mas eu tinha cordões de maçãs, descaroçadas e secas, penduradas nas vigas do meu aposento, e puxei uma para ela.

- Tome.

O outono é a época de secar, de preservar, a época de colher maçãs e gordura de ganso. O inverno é a época da fome, da neve e da morte, e é a época de Festival, quando esfregamos gordura de ganso na pele de um porco e o
recheamos com as maçãs colhidas no outono, e então o assamos ou grelhamos, e organizamos o festival enquanto ele estala no fogo.

Ela pegou a maçã seca e começou a mordiscá-la, com seus dentes amarelos e afiados.

- Está boa?

Ela assentiu. Eu sempre tive medo da princesinha, mas naquele momento me aconcheguei a ela e com meus dedos, gentilmente, acariciei seu rosto. Ela olhou para mim e sorriu - ela sorria raramente - , e então fincou seus dentes na base do meu polegar, tirando sangue.

Eu ia começando a gritar, de dor e surpresa; mas ela olhou para mim e eu caí em silêncio.

A princesinha fixou sua boca à minha mão, e lambeu, chupou, sugou. Quando terminou, deixou meus aposentos. Diante do meu olhar, a perfuração feita por ela começou a se fechar, a cicatrizar, a sarar. No dia seguinte, ela era como uma cicatriz antiga: eu poderia ter cortado minha mão com um canivete, quando era criança.

Eu havia sido congelada por ela, possuída e dominada. Aquilo me assustou, mais do que o sangue de que ela havia se alimentado. Depois daquela noite, eu trancava meus aposentos ao anoitecer, barrando a porta com uma tranca de carvalho, e pedi ao ferreiro que fizesse barras de aço e as colocasse nas minhas janelas (...).

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A Vingança

Em "A Guardadora de Ganços" o Rei inquere àquela que se passou pela princesa qual seria o castigo ideal para alguém que fizesse tal coisa. A dama, sem perceber ter sido descoberta, responde: "Ela mereceria ser colocada nua dentro de um barril forrado de ferros pontiagudos, e dois cavalos brancos deveriam arrastar este barril pela cidade, até que ela morresse". Rei então aplicou tal castigo a ela.

O Caçador enche de pedras a barriga do Lobo de "Chapeuzinho Vermelho" que cai no rio e, por causa do peso, morre afogado.

A bruxa de "João e Maria" , que desejava cozinhar as crianças no forno, é empurrada para dentro dele e queima até morrer.

Em "Irmão e Irmã" a bruxa é lançada ao fogo para morrer.

A Rainha de "Branca de Neve" estava saindo do casamento da enteada quando acabou tropeçando num par de botas de ferro que estavam aquecidas em brasa. As botas fixaram-se na rainha e obrigaram-na a dançar, e ela dançou e dançou, até finalmente, cair morta.

As irmãs de Cinderella tem os olhos bicados por passarinhos até cegarem.

O Barba Azul é assassinado com espadas pelos irmãos de sua esposa.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Trecho de O Gato de Botas

Meu querido ogro, tenho ouvido por aí umas histórias a teu respeito. Dizei-me lá: é certo que te podes transformar no que quiseres?

- Certíssimo – respondeu o ogro, e transformou-se num leão.

- Isso não vale nada – disse o gatinho. – Qualquer um pode inchar e aparecer maior do que realmente é. Toda a arte está em se tornar menor. Poderias, por exemplo, transformar-te em rato?

- É fácil – respondeu o ogro, e transformou-se num rato.

O gatinho deitou-lhe logo as unhas, comeu-o e desceu logo a abrir a porta, pois naquele momento chegava a carruagem real.

Trecho de O Barba Azul

A princípio não viu coisa alguma, porque as janelas se achavam fechadas; momentos depois começou a notar que o assoalho estava todo coberto de sangue coalhado, no qual se espelhavam os corpos de várias mulheres mortas, presas ao longo das paredes (eram todas mulheres que Barba-Azul desposara e que havia estrangulado). Cuidou morrer de susto, e a chave do gabinete que acabava de retirar da fechadura, caiu-lhe da mão. Após haver recobrado um pouco o ânimo, apanhou a chave, fechou a porta e subiu ao quarto para refazer-se; não o conseguia, porém, devido à sua grande perturbação.
Tendo notado que a chave do gabinete estava manchada de sangue, limpou-a duas ou três vezes, mas o sangue não desaparecia; lavou-a, esfregou-a com sabão e pedra-pomes; debalde: o sangue ficava sempre, pois a chave era fada, e não havia meio de limpá-la inteiramente: quando se tirava o sangue de um lado, ele voltava do outro.

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